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Em dia com as crianças

<p> <em>Psicol&oacute;ga e publicit&aacute;ria do Instituto Alana fala sobre os limites para a forma&ccedil;&atilde;o da crian&ccedil;as</em></p>

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Atualizado: 

28/07/2011

Quando você pensa no Dia das Crianças o que lhe vem à cabeça? Lojas de brinquedos lotadas nos shopping centers? Filas imensas para pagar? Mais uma dívida no cartão de crédito? Apesar de todas essas imagens corresponderem à realidade, já que a data está entre as campeãs de consumo para os brasileiros, o ideal é que o dia 12 de outubro seja visto pelos pais (tios, avós e cia) como uma oportunidade para reforçar aos pequenos o amor que sentem por eles. Os presentes são bem-vindos, desde que sejam apenas uma forma de representar o afeto e não dispensem as brincadeiras e a companhia dos adultos. 

É o que recomenda a psicóloga e publicitária Maria Helena Masquetti, que atua nas áreas de comunicação e suporte jurídico do Projeto Criança e Consumo, do Instituto Alana. Por telefone, Maria Helena conversou com o Idec sobre a relação entre o Dia das Crianças e o consumismo, sobre a importância do brincar (o que não é o mesmo que ter brinquedos) e dos limites para a formação dos pequenos. Leia abaixo a entrevista.

O Dia das Crianças está entre as datas de maior consumo para as famílias brasileiras. Você acha que a associação da data com presentes é adequada?

A associação do dia das crianças com presentes foi feita pelo interesse comercial que vem transformando a data em sinônimo de comprar. Faz parte da habilidade do marketing detectar nichos de consumo, e vender para crianças é maravilho para eles, pois, por não ter o juízo crítico para julgar o caráter persuasivo das mensagens, elas facilmente se convencem de que a felicidade está nos objetos e que esses objetos são ingressos sociais, condições para elas fazerem parte dos grupos. 

No entanto, nessa data, a criança deveria ser homenageada com o que ela mais precisa, que é o afeto, a certeza do quanto elas são importantes e amadas, além de espaço para brincarem. A ideia é que elas possam brincar mesmo, e não consumir brinquedos, os quais na maioria das vezes já vêm prontos, brincando praticamente sozinhos. 

Ter brinquedo não é sinônimo de brincar, não é mesmo? É comum ver crianças que têm caixas lotadas deles, mas não brincam. Elas se entretêm por um tempo quando ganham um item novo, mas logo se desinteressam por ele. O que está errado?

A descartabilidade dos produtos indica que a expectativa em torno do brinquedo não parte de um desejo tão genuíno, mas de um desejo que foi colocado de fora para dentro da criança pelas mensagens [publicitárias], que a convencem que ela precisa de uma coisa que, muitas vezes, não é o que ela queria realmente.

Hoje, a criança não está mais tão ligada ao significado do brinquedo. Em geral, elas não falam: "venha ver o meu brinquedo" e sim: "venha ver o quanto eu tenho de brinquedo". Como não existe mais a referência do brinquedo como um desejo que a criança buscou, fica sendo a montanha de brinquedo pela montanha de brinquedo. 

E o maior problema disso tudo é que, por conta dessa comunicação que tanto promete para elas um mundo de diversão, as crianças vão sendo induzidas a comprar tudo o que veem e acabam atrelando o conceito de felicidade a ter coisas. E no futuro vai ser difícil convencer esse indivíduo que ele pode ser feliz sem consumir tanto.

Sabendo que evitar a compra de presentes no Dia das Crianças é bastante difícil, você vê algum modo de os pais transformarem o ato de consumo em uma situação educativa para seus filhos?

Como dizia o poeta, "tudo vale a pena se a alma não é pequena". Então, mesmo numa situação de consumo, os pais podem aproveitar a ocasião para passar valores para as crianças, tais como a inconsequência do consumo em excesso, o valor do limite - dizer "não" é um dado importante porque a criança é colocada em contato com a realidade e isso é fundamental para o desenvolvimento da saúde emocional dela. 
Assim, de um jeito delicado, afetivo, os pais devem mostrar aos filhos que existe uma outra possibilidade de se comemorar o Dia das Crianças. Não há coisa que a criança goste mais do que ver os pais brincando, interagindo com elas! E os pais não podem perder a confiança em quem eles são, no poder representativo que têm para a criança, não achar que só o que vem da tevê importa para ela. 

Como mostrar às crianças que o ato de presentear e ganhar presentes é muito mais importante do ponto de vista afetivo que material?
Os pais não podem dar o presente e se afastar da criança, pois é como se eles dissessem que o brinquedo tem a capacidade de substituí-los afetivamente. Eles têm que se doar junto, ajudando a criança a perceber que o presente está representando o quanto os pais o amam, o quanto querem estar com ele. 

Além de dar o presente que a criança pediu, é interessante criar alguma coisa para ela, ou então levá-la para passear num lugar ao qual ela queria ir. Tudo isso para começar a desatrelar a ideia de que só o objeto pode representar esse afeto. Também é importante afastá-la do cenário consumista no Dia da Criança, passear, brincar com ela para plantar a ideia de que dá para fazer muita coisa, se divertir e ser feliz com coisas que elas não pegam com as mãos, ensinando o valor do invisível como moeda de troca.

Você comentou sobre a importância de dizer "não" às crianças de vez em quando. Por que os pais têm tanta dificuldade diante dos apelos dos filhos por brinquedos ou roupas novas mesmo sabendo que eles não precisam daquilo?

Como o bombardeio de mensagens [publicitárias] diz à criança que ela precisa daquilo e prometem que ela será mais feliz, mais aceita, ela acaba sendo muito convincente para os pais. Mas a criança não pede porque está sendo "espertinha", e sim porque realmente acreditou que precisa daquilo para ser feliz, que o mundo funciona daquela forma, então ela é muito sincera - é como se ela dissesse: "meus pais não estão entendendo, eu preciso muito desse brinquedo!". Como a preocupação dos pais é ver os filhos felizes, eles acabam cedendo porque a situação os comove muito. 

Além disso, a gente precisa lembrar que os pais também foram criados nessa lógica consumista que afirma que ter coisas, comprar e ganhar tem um significado de competência, de realização. Isso também foi entranhando-se na nossa formação e, junto com o apelo forte das crianças, acaba levando à rendição dos pais. 

Mas os pais devem resistir a essa força das comunicação mercadológica e do discurso das crianças, pois elas estão testando limites. Assim, os pais não podem se colocar na condição de mais frágeis por um temor bobo de serem caretas; não devem perder a confiança e lembrar que são as pessoas mais importantes na formação dos filhos.

Quais sugestões você dá às famílias que querem passar um Dia das Crianças agradável e longe dos shopping centers?

Fujam para os parques, bibliotecas, casas dos amigos, dos parentes. Valorizem os momentos íntimos da família, os almoços à mesa, as conversas. Os pais não podem se esquecer de que os filhos, logo cedo, vão constituindo a memória. E as lembranças dependem muito das emoções para se fixarem, então se os momentos juntos de família estiverem atrelados à ideia de diversão, de alegria, vão ser guardados na memória da criança

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