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Mentira verde

Mentira verde

Idec lança guia sobre greenwashing e ensina a identificar essa prática abusiva.

Idec lança guia que explica a consumidores o que é o greenwashing e ensina como não ser vítima dele.

Se você é alguém que busca consumir de forma mais responsável, pois se preocupa com o futuro do planeta, provavelmente tenha em sua casa algum produto com as expressões “ecológico”, “100% natural” ou “amigo da natureza” no rótulo. Mas você já se perguntou o que esses dizeres significam exatamente? Será que um cosmético vendido como 100% natural não tem mesmo nenhum ingrediente sintético em sua composição? E o que um detergente amigo do meio ambiente tem de especial?

Atentas às exigências de um mercado consumidor cada vez mais informado, algumas empresas sérias vêm adotando processos mais éticos e transparentes. No entanto, boa parte delas continua apenas fingindo se preocupar com questões ambientais importantes. Elas usam apelos ecológicos em suas embalagens para chamar atenção. Acontece que, em muitos casos, esse discurso “verde” não representa a realidade dos ingredientes daquele produto e/ou não é acompanhado de mudanças reais nas práticas e nos processos internos da empresa. “Quando uma empresa manipula, esconde ou inventa informações para passar uma imagem de ecologicamente responsável, pratica o que se chama de greenwashing, traduzido como ‘maquiagem verde’, ‘lavagem verde’ ou ‘mentira verde’ ”, informa Julia Catão Dias, especialista do programa de Consumo Sustentável do Idec.

Em 2019, o Idec avaliou produtos de higiene, limpeza e utilidades domésticas, além de cosméticos comercializados nos cinco principais supermercados de São Paulo (SP) e do Rio de Janeiro (RJ), e constatou que 48% deles continham em seu rótulo falsas alegações ambientais, prática que viola o direito à informação clara e adequada previsto no artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor (CDC). Por isso, o Idec luta para combater a mentira verde e cobra de empresas e governos atitudes mais honestas e de fato sustentáveis. Uma de suas ações nesse sentido é o lançamento, em março, do guia É mentira verde!, que tem como objetivo informar e educar os cidadãos brasileiros sobre essa prática. “As pessoas fazem compras acreditando que estão investindo numa marca mais sustentável e responsável, confiando naquela empresa, mas estão sendo enganadas. No fim das contas, elas não estão exercendo um consumo mais consciente. Por isso é importante exigir informações de qualidade”, afirma Leticia Méo, advogada, consultora em sustentabilidade ESG e autora do livro Greenwashing e o direito do consumidor: como prevenir ou reprimir o marketing ambiental ilícito. Ela acrescenta, ainda, que ao demandar melhores práticas, acabamos melhorando o nível de sustentabilidade das empresas: “Se não exigimos, elas ficam à vontade para oferecer informações genéricas. E não sabemos se a empresa está avançando nos compromissos de responsabilidade socioambiental”.

CONSUMIDORES PROTEGIDOS

Infelizmente, não existe no Brasil uma lei específica que define o que é greenwashing e estabelece regras para lidar com ele. Contudo, o Idec entende que o CDC é suficiente para proibir que as empresas pratiquem a mentira verde, já que ele veda, em seu artigo 37, publicidade enganosa e abusiva. Além disso, o artigo 170 da Constituição Federal prevê que a ordem econômica tem de ser fomentada desde que não viole direitos de consumidores e o meio ambiente equilibrado. Existem, ainda, outros guias que servem para interpretar casos de greenwashing, como o Código do Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar) e um guia da Organização das Nações Unidas (ONU).

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IDENTIFIQUE A MENTIRA VERDE

A seguir, listamos as principais estratégias das empresas para enganar os clientes.

1) SEM PROVAS

Produtos que se dizem “ambientalmente corretos” usando apelos ambientais que não podem ser comprovados por informações facilmente acessíveis ou por uma certificação confiável. Por exemplo, cosméticos “veganos” que não possuem certificados terceirizados e não listam os ingredientes no rótulo.

2) TROCA OCULTA

Ocorre quando uma questão ambiental é enfatizada em detrimento de outras importantes. Por exemplo, a empresa destaca que seu produto é sustentável porque é feito de papel. No entanto, esconde que, para produzi-lo, utilizou vários aditivos químicos, que a floresta foi plantada em uma área de desmatamento ilegal etc. “Nesse caso, teria sido melhor comprar um item de plástico reutilizável e reciclável. Ser de papel nem sempre significa que é sustentável”, alerta Julia Catão Dias, do Idec.

3) VAGUEZA E IMPRECISÃO

Uso de expressões mal definidas e vagas, como “sustentável” e “amigo do meio ambiente” na embalagem, sem fornecer detalhes e explicações sobre ações ambientalmente concretas. “Um produto que se vende como ‘100% natural’ não é necessariamente sustentável, pois elementos como arsênio, urânio e mercúrio são naturais e podem fazer bastante mal à saúde e ao meio ambiente”, exemplifica Dias.

4) IRRELEVÂNCIA

Apelo que pode ser verdadeiro, mas não é relevante para o consumidor que procura um produto com vantagem ambiental. “Não contém CFC” é o exemplo mais comum. O uso dessa substância é proibido por lei, o que significa que o produto não é mais ambientalmente correto do que qualquer outro da categoria.

5) MENOR DE DOIS MALES

Ocorre quando o apelo ambiental é verdadeiro, mas tira o foco do consumidor para os impactos ambientais maiores causados por aquele tipo de produto. Um item descartável que afirma possuir menos plástico, por exemplo, continua sendo de plástico e, portanto, um problema na hora do descarte.

6) LOROTA

Embalagens que contêm declarações falsas, como as que afirmam que o produto possui descarte seletivo, quando a empresa não possui controle sobre isso. “Ou copos descartáveis que se dizem 100% biodegradáveis. Ele se degrada naturalmente no ambiente? Se não, é mentira verde!”, acrescenta Dias.

7) FALTA DE COMPROVAÇÃO

Quando há falsa sugestão ou imagem que parece um selo para induzir o consumidor a pensar que o produto é certificado e, portanto, sustentável.

 

Para Méo, o Brasil tem todo o aparato legislativo contra o greenwashing, mas está atrasado em relação a outros países, porque além de não contar com uma legislação específica, não faz a fiscalização necessária. Ela destaca que existem países, inclusive aqui na América do Sul, que estão mais avançados, como a Colômbia. Os Estados Unidos têm uma norma específica e uma agência responsável pelas fiscalizações. A União Europeia também é muito mais ativa quanto à fiscalização do que as empresas falam por aí. Além disso, está tramitando por lá uma nova regulação, a Diretiva 166/2023, que foca nas informações ambientais em produtos e traz diversos avanços e várias exigências. Ela quer, por exemplo, proibir as empresas de fazerem alegações ambientais que não sejam comprovadas por certificações dadas por organizações independentes.

TERMO POUCO CONHECIDO

Embora os consumidores costumem relatar em pesquisas de opinião que gostariam de comprar produtos sustentáveis e de marcas que tenham responsabilidade socioambiental, um dos motivos para não fazê-lo é o marketing enganoso e a falta de informação. Ou seja, o greenwashing. Porém, esse termo em inglês – e mesmo suas traduções para o português – ainda são desconhecidos do grande público. Méo defende que precisamos de mais gente falando sobre o assunto. “Falta conhecimento de todos, mas essa evolução social precisa acontecer urgentemente, porque os consumidores estão sendo enganados”, ela adverte.

A jornalista Priscila Arone, de São Paulo (SP), não conhece a palavra greenwashing, mas se sente atraída por apelos ambientais nas embalagens. Entretanto, ela desconfia, principalmente quando o rótulo diz que o produto é “100% natural”. “Quando é comida, eu olho a lista de ingredientes, mas com cosméticos é praticamente impossível”, ela diz. Já a professora Kavita Miadaira Hamza, que também mora em São Paulo (SP), pertence ao pequeno grupo que conhece o termo greenwashing. “Tentar vender um produto sob o pretexto de ser sustentável só traz consequências negativas. O consumidor fica desconfiado, não apenas daquela marca, mas de várias outras, que até podem estar fazendo um bom trabalho. É ruim para o mercado”, ela opina.

FAÇA A SUA PARTE!

 

 

  • Desconfie sempre de rótulos ambientais com apelo para a sustentabilidade, principalmente se forem termos vagos como “ecológico”, “sustentável” ou “amigo do meio ambiente”. Pergunte-se se há informações suficientes que comprovem aquela alegação.

  • Seja crítico ao ler o rótulo ou ver uma publicidade. Questione-se: “Eu consigo entender o que é essa iniciativa mais sustentável que a empresa diz que tem?”, “Existe alguma comprovação?”.

  • Desconfie de selos. Muitos deles são criados pela própria empresa e passam uma imagem equivocada de certificação independente de terceiros.

  • Entre em contato com a empresa por meio do Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC) ou das mídias digitais e solicite provas que confirmem as alegações do rótulo (no guia há um modelo de carta que pode te ajudar). “Quanto mais a gente questionar as empresas, mais elas se sentirão forçadas a dar informações com mais qualidade”, acredita Méo.

  • Acompanhe o trabalho de organizações preocupadas com a responsabilidade socioambiental das empresas.

  • Denuncie as empresas que praticam o greenwashing e cobre delas ações verdadeiramente sustentáveis. Você pode procurar o Procon da sua cidade ou estado, e o Conar, além de acessar a plataforma Consumidor.gov.br.

 

Saiba mais